Particular
Descrição
Exílio - Revista Mensal de Arte, Lettras e Sciencias - Abril 1916 - 1ª edição
Excelente exemplar. Capas de brochura originais em excelente estado
Bonita encadernação
Fernando Pessoa - Hora Absurda
- Movimento Sensacionista
Tal como escreveu Teresa Almeida, no estudo introdutório à edição fac-similada desta revista, pode-se afirmar que Exílio se situa entre o Nacionalismo e o Modernismo.
Exílio aponta desde logo para um degredo das letras que o seu editor, Augusto de Santa-Rita, irmão mais arrière-garde e saudosista de Santa-Rita Pintor, tanto cultivava. Os três sonetos que decide incluir na publicação (a grande forma tradicional que abunda em Exílio) misturam essa dupla Religião-Raça que tanto as publicações passadistas de então impuseram. Os títulos são significativos: "Signal da Raça", "Tua Presença" e "Céu". A grande cruz de Cristo que encima a parte gráfica da página de rosto é também simbólica disto mesmo. O texto de Côrtes-Rodrigues, tímido modernista e amigo pessoal de Pessoa, que se intitula "Via-Sacra" vai também neste sentido.
O programa da publicação era claro, aludido logo no primeiro texto - "Sua Justificação", da autoria do seu editor. De seguida, temos um poema de um dos de Orpheu, talvez o menos conhecido do grupo, Alfredo Guisado, escrevendo sob o pseudónimo de Pedro de Menezes. Trata-se de os sonetos "O Mêdo de Satan à noite", verdadeiros hinos à noite, bem à maneira simbolista, com alusão ao vago, e uma descrição lânguida e pesada tão comum nos textos do movimento. A Pedro de Menezes/Alfredo Guisado, vai a revista aludir ainda, via Fernando Pessoa, precisamente no último texto, como que fechando o círculo,
Um dos textos mais importantes de Exílio é precisamente este, da autoria de Pessoa. Nele, desenvolve a sua teoria sensacionista e assina enquanto "poeta sensacionista". Nesse texto final, Pessoa contrapõe duas obras publicadas nesse ano (por Pedro de Menezes e por João Cabral do Nascimento, um poeta do Funchal, monárquico e integralista) mostrando que acaba por ser, cada uma à sua maneira, sensacionista.
Aliás, o poeta de Mensagem colabora aqui como crítico e como autor. Inclui, nas pgs. 13-16 de Exílio, um dos mais importantes poemas do seu primeiro periodo simbolista, "Hora Absurda", datado de 4 de Julho de 1913, e portanto escrito meses antes do aparecimento dos heterónimos (Março de 1914). Porém, quando aqui o publica, já Fernando Pessoa estaria distante desse texto, desenvolvendo a sua teoria paúlica, primeiro dos ismos (depois Interseccionismo e então Sensacionismo). O Sensacionismo, como se sabe, é o último ismo criado por Fernando Pessoa, c. 1915, na sequência de outros dois – Paulismo e Interseccionismo – surgidos nos anos imediatamente anteriores (c.191********14-15, respectivamente), e vindo funcionar como ismo aglutinador de todos eles. De forma a podermos dizer que, ainda que estejamos perante um poema sensacionista, a sua filiação estética e técnica tenha mais directamente a ver com o Interseccionismo - um dos seus elementos.
Voltando um pouco ao início, é de notar nesta publicação literária a presença de vários textos que informam da ideia nacionalista: Leite de Vasconcelos, o eminente antropólogo de Etnografia Portuguesa, escreve sobre Numismática Portuguesa, num artigo detalhado e minucioso bem ao seu jeito, já Cláudio Basto (também etnógrafo e colaborar frequente da publicação que Leite de Vasconcelos fundara já em 1889: Revista Lusitana) escreve sobre a morfologia de nomes, com base em freguesias do Minho. Teófilo Braga completa a trindade da ilustre e velha intelligentsia, assinando um artigo histórico sobre as lutas da Restauração, nomeadamente a ligação entre os Braganças e os Jesuítas. Como vemos, os três artigos, logo na sua temática, são paradigmáticos de um certo nacionalismo passadista e ornamentado.
Neste sentido, a colaboração de António Ferro, mais um dos de Orpheu, mostra a presença de um certo tradicionalismo na poesia de então: para Exílio Ferro envia quadras ao gosto popular, musicadas por David de Souza.
António Sardinha é também, surpreendentemente, um dos autores de Exílio. Talvez não tão surpreendente quanto à primeira vista se julgue, se atendermos ao índice e ao que dissemos anteriormente, Alberto Monsaraz, outro eminente integralista, é alvo da dedicatória de "Poente de Nero", um longo poema em duas partes da autoria de um desconhecido (Martinho Nobre de Mello). Trata-se de uma invectiva histórica sobre a história do romano onde se pode ler muito da história recente de Portugal, num claro aviso aos leitores.
Ainda que um pouco arrière-garde, como se referiu, alguns textos parecem querer soltar-se dos grilhões estabelecidos. O melhor exemplo na revista é, para além do texto de Pessoa, a efabulação fantástica que constitui "Memórias d'um Espelho", da autoria de um desconhecido (António Rita-Martins) e dedicado a Almada Negreiros. Aqui, o texto inova pela sua narração algo cinematográfica, vivendo através de flashes analépticos e de imagens da vida de um espelho: um texto imaginativo e singular.
Do ponto de vista visual, Exílio é quase desprovido de imagens. A letra de incipit de cada artigo lembra a iluminura medieval, e a própria capa, a que já aludimos, mostra uma letra estilizada, antiga, encimada pela cruz de Cristo. Tal como noutras publicações periódicas literárias deste período, os clichés começam a ser considerados como forma de ilustração. A meio de Exílio aparece assim um retrato inédito de Guerra Junqueiro, que constitui igualmente uma forma de legitimação da revista. O seu autor, Victoriano Braga, é também o responsável pela crónica teatral (p.44), onde se noticia de resto um facto importante: a inauguração do Teatro República (actual São Luiz) que servirá de palco, no ano seguinte, para a 1ª Conferência Futurista de Almada e Santa-Rita...
Degredo ou Exílio são assim palavras razoáveis quando falamos desta revista. Uma continuidade modernista de Orpheu, com a inclusão de textos das suas figuras mais tímidas e menos inovadoras, mas também um passo atrás, reflexo do gosto e dos valores do seu editor: "Exílio - será finalmente a linda praia em desterro para onde voluntariamente se expatriarão todos os que, independentemente de côr política, confiam ainda no ressurgimento de Portugal pelos novos."
Ricardo Marques
Modernismo
Excelente exemplar. Capas de brochura originais em excelente estado
Bonita encadernação
Fernando Pessoa - Hora Absurda
- Movimento Sensacionista
Tal como escreveu Teresa Almeida, no estudo introdutório à edição fac-similada desta revista, pode-se afirmar que Exílio se situa entre o Nacionalismo e o Modernismo.
Exílio aponta desde logo para um degredo das letras que o seu editor, Augusto de Santa-Rita, irmão mais arrière-garde e saudosista de Santa-Rita Pintor, tanto cultivava. Os três sonetos que decide incluir na publicação (a grande forma tradicional que abunda em Exílio) misturam essa dupla Religião-Raça que tanto as publicações passadistas de então impuseram. Os títulos são significativos: "Signal da Raça", "Tua Presença" e "Céu". A grande cruz de Cristo que encima a parte gráfica da página de rosto é também simbólica disto mesmo. O texto de Côrtes-Rodrigues, tímido modernista e amigo pessoal de Pessoa, que se intitula "Via-Sacra" vai também neste sentido.
O programa da publicação era claro, aludido logo no primeiro texto - "Sua Justificação", da autoria do seu editor. De seguida, temos um poema de um dos de Orpheu, talvez o menos conhecido do grupo, Alfredo Guisado, escrevendo sob o pseudónimo de Pedro de Menezes. Trata-se de os sonetos "O Mêdo de Satan à noite", verdadeiros hinos à noite, bem à maneira simbolista, com alusão ao vago, e uma descrição lânguida e pesada tão comum nos textos do movimento. A Pedro de Menezes/Alfredo Guisado, vai a revista aludir ainda, via Fernando Pessoa, precisamente no último texto, como que fechando o círculo,
Um dos textos mais importantes de Exílio é precisamente este, da autoria de Pessoa. Nele, desenvolve a sua teoria sensacionista e assina enquanto "poeta sensacionista". Nesse texto final, Pessoa contrapõe duas obras publicadas nesse ano (por Pedro de Menezes e por João Cabral do Nascimento, um poeta do Funchal, monárquico e integralista) mostrando que acaba por ser, cada uma à sua maneira, sensacionista.
Aliás, o poeta de Mensagem colabora aqui como crítico e como autor. Inclui, nas pgs. 13-16 de Exílio, um dos mais importantes poemas do seu primeiro periodo simbolista, "Hora Absurda", datado de 4 de Julho de 1913, e portanto escrito meses antes do aparecimento dos heterónimos (Março de 1914). Porém, quando aqui o publica, já Fernando Pessoa estaria distante desse texto, desenvolvendo a sua teoria paúlica, primeiro dos ismos (depois Interseccionismo e então Sensacionismo). O Sensacionismo, como se sabe, é o último ismo criado por Fernando Pessoa, c. 1915, na sequência de outros dois – Paulismo e Interseccionismo – surgidos nos anos imediatamente anteriores (c.191********14-15, respectivamente), e vindo funcionar como ismo aglutinador de todos eles. De forma a podermos dizer que, ainda que estejamos perante um poema sensacionista, a sua filiação estética e técnica tenha mais directamente a ver com o Interseccionismo - um dos seus elementos.
Voltando um pouco ao início, é de notar nesta publicação literária a presença de vários textos que informam da ideia nacionalista: Leite de Vasconcelos, o eminente antropólogo de Etnografia Portuguesa, escreve sobre Numismática Portuguesa, num artigo detalhado e minucioso bem ao seu jeito, já Cláudio Basto (também etnógrafo e colaborar frequente da publicação que Leite de Vasconcelos fundara já em 1889: Revista Lusitana) escreve sobre a morfologia de nomes, com base em freguesias do Minho. Teófilo Braga completa a trindade da ilustre e velha intelligentsia, assinando um artigo histórico sobre as lutas da Restauração, nomeadamente a ligação entre os Braganças e os Jesuítas. Como vemos, os três artigos, logo na sua temática, são paradigmáticos de um certo nacionalismo passadista e ornamentado.
Neste sentido, a colaboração de António Ferro, mais um dos de Orpheu, mostra a presença de um certo tradicionalismo na poesia de então: para Exílio Ferro envia quadras ao gosto popular, musicadas por David de Souza.
António Sardinha é também, surpreendentemente, um dos autores de Exílio. Talvez não tão surpreendente quanto à primeira vista se julgue, se atendermos ao índice e ao que dissemos anteriormente, Alberto Monsaraz, outro eminente integralista, é alvo da dedicatória de "Poente de Nero", um longo poema em duas partes da autoria de um desconhecido (Martinho Nobre de Mello). Trata-se de uma invectiva histórica sobre a história do romano onde se pode ler muito da história recente de Portugal, num claro aviso aos leitores.
Ainda que um pouco arrière-garde, como se referiu, alguns textos parecem querer soltar-se dos grilhões estabelecidos. O melhor exemplo na revista é, para além do texto de Pessoa, a efabulação fantástica que constitui "Memórias d'um Espelho", da autoria de um desconhecido (António Rita-Martins) e dedicado a Almada Negreiros. Aqui, o texto inova pela sua narração algo cinematográfica, vivendo através de flashes analépticos e de imagens da vida de um espelho: um texto imaginativo e singular.
Do ponto de vista visual, Exílio é quase desprovido de imagens. A letra de incipit de cada artigo lembra a iluminura medieval, e a própria capa, a que já aludimos, mostra uma letra estilizada, antiga, encimada pela cruz de Cristo. Tal como noutras publicações periódicas literárias deste período, os clichés começam a ser considerados como forma de ilustração. A meio de Exílio aparece assim um retrato inédito de Guerra Junqueiro, que constitui igualmente uma forma de legitimação da revista. O seu autor, Victoriano Braga, é também o responsável pela crónica teatral (p.44), onde se noticia de resto um facto importante: a inauguração do Teatro República (actual São Luiz) que servirá de palco, no ano seguinte, para a 1ª Conferência Futurista de Almada e Santa-Rita...
Degredo ou Exílio são assim palavras razoáveis quando falamos desta revista. Uma continuidade modernista de Orpheu, com a inclusão de textos das suas figuras mais tímidas e menos inovadoras, mas também um passo atrás, reflexo do gosto e dos valores do seu editor: "Exílio - será finalmente a linda praia em desterro para onde voluntariamente se expatriarão todos os que, independentemente de côr política, confiam ainda no ressurgimento de Portugal pelos novos."
Ricardo Marques
Modernismo
ID: 651033265
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Publicado 10 de maio de 2024
Fernando Pessoa - Exilio - Revista 1916
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